Excertos de

Walter Benjamin

sobre colecionismo e bibliofilia

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Walter Benjamin na Bibliothèque nationale,
Paris, 1939. Foto: Gisele Freund

Prólogo

As folhas traziam as marcas dos dedos que as tinham virado. O cordão que rematava a encadernação e sobressaía em cima e em baixo estava sujo. Mas a lombada é que teve de suportar mais maus-tratos, e por isso as duas capas estavam desencontradas e o topo de corte do livro formava escadinhas e terraços. Mas das suas folhas pendiam, como o verão tardio dos ramos das árvores, os tênues fios de uma rede na qual em tempos, quando aprendi a ler, me deixei enredar. [...]

O ar ameno dos calhamaços que a impregnava insinuava-se tão irresistivelmente no meu coração que este permanecia para sempre fiel a esses volumes usados.

Ou seria uma fidelidade a outros, mais velhos e mais difíceis de encontrar? Àqueles livros maravilhosos que só me era dado voltar a ver uma vez em sonhos? Que título tinham? Eu não sabia, só sabia que eram livros há muito desaparecidos, que eu nunca mais tinha encontrado.

Tradução de João Barrento.
“Livros para rapazes”. Infância berlinense. In: Rua de mão única. Infância berlinense. Belo Horizonte: Autêntica, 2013, p. 50.